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O que é o Chupadados e por onde anda essa entidade?

 
 

Eles são bonitos, gentis, nos fazem companhia e nos fazem sentir atraentes e amparados. Nos apaixonamos por eles e depositamos ali toda a nossa confiança, dos gestos mais cotidianos aos segredos mais íntimos. Eles são nossos objetos de desejo e sonhos de consumo. Até o dia em que percebemos que controlam o que fazemos, monitoram quem encontramos e compartilham nossa intimidade com quem não tem nada a ver com isso.

Sob conceitos como "Big Data", "Smart Cities" e "Internet das Coisas", vivemos a crença de que a abundância de dados, somada à alta capacidade de processamento de computadores com algoritmos inteligentes, possibilita mais facilidade e maior eficiência nas vendas, na economia, no combate ao crime, na mobilidade, na proteção do meio ambiente, na garantia da segurança, da saúde e muitos dos problemas que enfrentamos globalmente. Mas como funcionam essas tecnologias e a serviço de quais interesses elas trabalham?

Sensores cada vez mais avançados possibilitam a digitalização massiva dos ambientes em que vivemos, dos nossos corpos e de nossos hábitos. Esse processo faz com que nossos movimentos, gostos de consumo, pensamentos íntimos, sentimentos e relações sejam registrados e transformados em dados, em informações de valor que são exploradas economicamente.

A inteligência do Chupadados foi descobrir que cada busca, click, curtida, compartilhamento que damos, ou mesmo a informação de quanto tempo o cursor do mouse passa sobre alguma imagem, poderia ser monetizada. O sucesso desse modelo depende de que acreditemos que as informações das quais o Chupadados se alimenta são irrelevantes e de que ninguém deve ter nada a esconder. Em cima dessa ideologia, os mais diversos tipos de serviços e plataformas foram criados. Hoje, o número de tecnologias dominadas pelo Chupadados é expressivo. Em média, cada uma das mais de 1 bilhão de pessoas que estão no Facebook, por exemplo, passam 20 minutos ou mais por dia dando likes, comentando e visualizando conteúdos. Isso dá um total de mais de 300.000.000 horas por dia de um trabalho que é vital para a existência do Chupadados, e pelo qual as empresas não precisam pagar. Nossos dispositivos foram possuídos com a ladainha de que produzimos os dados em troca de poder usar seus serviços gratuitamente. A expansão da presença do Chupadados tem permitido que esse modelo seja adotado não apenas por empresas de tecnologias de informação, mas também, e cada vez mais, por seguradoras, imobiliárias, bancos, gestores públicos e polícias.

A especificidade desse sistema é que nós e nossas tecnologias de estimação estamos constantemente trabalhando de graça para construir, de maneira cada vez mais detalhada, perfis. Esses perfis são explorados para diversas finalidades, que vão do marketing à análises científicas, previsão de crimes e identificação de comportamento suspeito. Decisões feitas com base em perfis gerados por dados já começaram a determinar, de maneira simplória e duvidosa, quem somos, que conteúdos veremos ou deixaremos de ver, que tipo de produtos nos serão oferecidos; a que informações políticas devemos ou não devemos ter acesso; o que podemos ou não podemos dizer, mostrar ou ver; que fronteiras ou territórios podemos cruzar. Mais que isso, elas já podem determinar quem são as pessoas mais propensas a cometer crimes, a cometer violações de contratos de aluguel, a contrair dívidas ou a ter certos tipos de doença ou comportamento contra algum tipo de ordem estabelecida.

Apesar de muito detalhados, esses perfis criados por dados estão suscetíveis a erros de cálculo ou julgamentos enviesados. Tecnologias buscam resolver problemas, mas a formulação do problema e das soluções depende de quem as desenvolve. Elas podem reproduzir as visões políticas e sociais de seus criadores e colaborar para acentuar as mesmas injustiças que já conhecíamos antes, como discriminação racial, de classe e gênero. Sob o domínio do Chupadados, desigualdades tendem a ser cada vez mais legitimadas, já que ele promove a crença enganosa de que dados e algoritmos produzem análises objetivas, neutras e verdadeiras. Para encarar a face oculta das nossas tecnologias de estimação, reunimos aqui histórias sobre como mecanismos de vigilância estão a serviço do Chupadados e têm sido utilizados por nós mesmos, por governos e por empresas para monitorar pessoas no âmbito de suas cidades, casas, bolsos e corpos.



 

I. Cidade

Nos últimos anos, falamos sem parar em “cidades inteligentes”, como um progresso positivo e inquestionável. No entanto, nossa ampla variedade de aplicativos e dispositivos conectados, os chips em cartões de crédito, de transporte e outros sistemas de vigilância implementados por empresas e governos têm transformado nossas cidades em um grande banquete para o Chupadados. Precisamos estar atentos às falsas impressões, como o discurso de que mais câmeras trarão mais segurança para as cidades, e questionar a quem estamos informando por onde andamos, como e com quem.

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Natalia Zuazo conta como a instalação de câmeras de vigilância se tornou instrumento de marketing político na Argentina.

Cartões hackeados: diga-me por onde andas e te direi muito sobre você
  No Chile, uma falha de segurança no sistema de cartões de transportes permitiu que qualquer pessoa descobrisse as rotas diárias e outras informações sobre todos que usam transporte público.

Bilhete Único: concentração de dados e dinheiro no transporte público do Rio
Ao utilizar serviços como os Bilhetes Únicos, estamos gerando informação sobre quem somos e como nos comportamos na cidade. Por quê deveríamos nos preocupar com isso? Nossa equipe fez uma série de solicitações de informação ao sistema de transporte carioca e descobriu que dinheiro e dados de transporte nunca tiveram tão conectados.

Saí para caçar equipamentos de vigilância durante as Olimpíadas
Ao sair para buscar provas das aquisições de tecnologias de vigilância para os jogos olímpicos, Dia Kayyali percebeu que essas ainda não são as ferramentas preferidas da polícia. Ainda... mas conta como práticas como a do agente infiltrado no Tinder e o histórico de ações violetas contra vozes dissidentes apontam para uma série de abusos na incorporação de tecnologias.
 

II. Casa

O uso de tecnologias digitais não só modificou a maneira como organizamos nosso espaço interior e vida afetiva, como também possibilitou que nossos objetos conectados consigam codificar nossos hábitos domésticos e padrões de comportamento. Agora que trouxemos o Chupadados pra casa, precisamos entender o que essa entidade tão pouco confiável está fazendo com essas informações.

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Depois de causar polêmica no Chile, os balões não-tripulados de vigilância chegaram no Brasil e fora as vedetes do esquema de segurança Olímpico. Mas as câmeras realmente ajudam no combate ao crime? Quem vigia os vigilantes?

Em breve aqui, mais causos domésticos sobre a presença do Chupadados.
 

III. Bolso

Temos certeza de que o Chupadados habita os bolsos de boa parte da população. Mas o que poucos sabem é que ele extrai informações do celular no bolso esquerdo para tentar atingir a carteira no bolso direito. Ele determina seu perfil de consumidor, estima seu poder aquisitivo e pode tanto te encher de propaganda quanto influenciar os preços do que te é oferecido.

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Mãe é quem clica: estamos parindo crias do chupadados

 

IV. Corpo

Aplicativos menstruais, aplicativos esportivos, aplicativos de saúde, dildos, termômetros e coletores menstruais conectados à internet. Graças a esses dispositivos, hoje podemos converter doenças, sexualidades, calorias e sangue menstrual em informação, número e valor. O Chupadados interpreta essas informações com bem entende. Com sua mente obscura, ele te impõe padrões normativos sobre seu peso, sua saúde e sua vida sexual – ainda compartilha suas informações íntimas por aí. Chato, né?

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