Ops! Queremos nossas histórias circulando por aí, mas não queremos o Facebook rastreando todos os movimentos do site. Para compartilhar, copie e cole esse link:
https://chupadados.codingrights.org/?p=3415
Ops! Queremos nossas histórias circulando por aí, mas não queremos o Twitter rastreando todos os movimentos do site. Para compartilhar, copie e cole esse link:
https://chupadados.codingrights.org/?p=3415
Anúncios direcionados estão ficando tão específicos que é possível que descubram a cor e formato da sua calcinha, antes mesmo de você querer comprar uma.
Quem o Facebook pensa que você é? Porque aquele anúncio de
roupinha de bebê fica te perseguindo por aí? Quais as
consequências e limites éticos de uma publicidade que fala
contigo já sabendo no que você presta atenção? Resolvemos dar um
mergulho no mundo da propaganda direcionada do Facebook. E o
primeiro passo foi fazer anúncios sobre como entramos na mira
dessas propagandas:
Queríamos testar a quantidade de detalhes sobre a vida das
pessoas que podem ser associados e comercializados pelo Facebook.
E, usando essas informações, moldar uma narrativa capaz de puxar
um tema de conversa tão íntimo quanto as que se tem com amigos. A
expectativa era causar uma surpresa bem humorada que servisse
como gancho para um debate sobre o quanto o Facebook sabe sobre
nós e o que isso pode significar quando se trata da venda de
ideias e produtos.
E foi assim que perguntas do tipo, "Está se dando bem com a
nova chefia?", “Como está seu gato?”, e outros temas de conversas
frequentes entre amigas e nos papos de bar, agora começaram a
ocupar linhas do tempo no Facebook e Instagram, na forma de
anúncios patrocinados:
Parece que, na maioria das vezes, acertamos em cheio, tanto no
anúncio da motoqueira apaixonada, quanto no teletransporte para
as viajantes:
E começamos a instigar um diálogo sobre o que estava
acontecendo:
Respondendo à pergunta, detalhes do público alvo que
desenvolvemos para o anúncio do teletransporte:
E do anúncio da motoqueira:
Poucas pessoas se dão conta do grau de especificidade que é
possível atingir para então customizar uma mensagem publicitária.
Mas, seguindo apenas as possibilidades que o gerenciador de
anúncios do Facebook nos oferecia pela página
da Coding Rights na plataforma, sem adicionar nenhuma lista
de contatos e sem utilizar informações de nossos seguidores (ao
menos até onde a gente saiba), o Facebook nos permite falar, por
exemplo, com mulheres que se encaixam em categorias como:
conseguiram um novo emprego, vivem longe da família, preferem
pagar suas contas em dinheiro vivo ou no cartão de crédito, são
mães de adolescentes, gostam de produtos caros, gostam de
produtos baratos, gostam de tatuagem ou yoga, e por aí vai…
Por esse nível de detalhamento, pode-se imaginar como públicos
alvos de campanhas de marketing personagens como: “dona de gato”
que é “amiga de recém-casados" e de "expatriados nigerianos”;
“mãe", "dona de casa" que dirige uma minivan” “Volkswagen” “de 11
a 15 anos” “comprada entre 0 a 6 meses atrás”; “recém empregada”
que “tem interesse em "Muai Thai" e "bebida destilada”. É
possível pensar em vários ganchos de conversa com esses perfis,
certo?
Nossos experimentos com os anúncios direcionados causaram um
estranhamento bem humorado ao utilizar os detalhes da vida de
cada uma que são vendidos pelo Facebook como perfis. Mas, claro
que não é isso que anunciantes têm feito por aí. Na segunda parte
da nossa pesquisa, fizemos um levantamento de anúncios bizarros
que as pessoas recebem, simplesmente por serem consideradas
mulheres e se encaixarem em algum outro atributo, como idade ou
local. Para começar esse mapeamento, nossa primeira pergunta para
as redes foi:
A Rose estava olhando seu Face quando leu uma propaganda
estranha: "doe seus óvulos asiáticos". Ela ficou surpresa pelo
nível de detalhe. Devemos concordar com a Rose, é mesmo um pouco
demais.
Em outro artigo sobre as práticas do
mulheres grávidas são sinônimo de lucro para o mercado
publicitário. Agora descobrimos que, antes mesmo de
engravidarmos, alguns óvulos também valem ouro. Tentando
desvendar o estranhamento que o anúncio direcionado à Rose nos
causou, averiguamos que, ao menos nos EUA, os óvulos que as
clínicas de fecundação classificam como "asiáticos" são
considerados raros,
venderem seus óvulos para pagar a universidade no
país.
Seja você mãe ou não, parece que todos os aspectos da
maternidade, desde a contracepção à concepção, gestação, parto,
puerpério e criação dos filhos ainda continuam sendo temas para
publicitários tratarem corpos que consideram femininos. Outra
jovem, que aqui chamamos de Hilary, disse que começou a receber
anúncios de produtos de bebê, com fraldas e brinquedos. A maioria
de suas amigas eram casadas e começaram a procriar, mas ela disse
que não tinha nenhum plano de ter filhos em um futuro próximo.
"Eu comecei a receber propaganda de coisas de bebês, o que não se
aplica ao meu caso de maneira nenhuma", diz ela. "É como se o
Facebook tentasse me dizer no que devo me interessar, o que é
estranho."
Com o mesmo tipo de desconforto, uma apresentadora de TV
postou no Twitter que "anúncios do Facebook funcionam como
lembretes para as mulheres de 27 a 37 anos de que vocês deveriam
estar parindo" e adicionou uma captura de tela com a explicação
que o Facebook apresentou a ela por exibir uma propaganda sobre
esteiras para crianças:
E esse caso não é algo raro. Por meio de uma parceria com o
projeto "Who
Targets Me", tivemos a oportunidade de acessar uma base de
dados de propagandas direcionadas veiculadas no Facebook. Ainda
que o foco do projeto sejam campanhas políticas, a extensão de
browser que eles desenvolveram coleta todos os tipos de anúncios
publicados para cerca das 7000 pessoas que instalaram a
ferramenta, principalmente no Reino Unido. Então, pudemos fazer
uma busca de anúncios sobre produtos para bebês e averiguar se
eles eram direcionados apenas a mulheres:
Anúncio de roupinhas de bebê:
Anúncio de loja de todos os tipos de produtos para bebês (baby
gears):
Anúncio de cuidados com bebê:
Fizemos a mesma busca por anúncios contendo a palavra
"fertilidade" e o resultado foi semelhante. Nas duas pesquisas,
ainda que alguns fossem direcionados pelo anunciante para
"pessoas", foram mais visualizados por mulheres, ou seja, o
algoritmo do Facebook optou mostrar mais para mulheres. Não
encontramos nenhuma propaganda na base de dados que fosse sobre
bebês ou fertilidade direcionada apenas para homens.
"Eu mudei meu gênero no Facebook para escapar das propagandas
de bebês e doadores de esperma", diz outra mulher indignada no
Twitter. Não é por menos, afinal, ainda que algumas pessoas
possam dizer que mudamos desse tipo de propagandas que ilustravam a mulher apenas na cozinha, sempre fazendo algum trabalho doméstico:
Fonte: Envisioning the American Dream and Mad Men Art
... para anúncios como esses, que parecem mais neutros no que diz respeito aos papéis de gênero:
Mas se o único alvo desses anúncios são
mulheres, a realidade é que não vemos muita diferença das propagandas do passado, pois ambas continuam reforçando os papéis de gênero que tem sido questionados pelos vários feminismos. Sabemos que publicidade baseada em gênero ou anúncios que retratam
estereótipos de gênero não são um problema recente. Por décadas,
práticas do patriarcado que se estendem ao mercado tem
objetificado o corpo da mulher, associado determinado visual com
noções de beleza ou sexualidade e até mesmo determinado o que é
saúde ou doença física e psicológica. Mas quando isso acontece
transvestido de neutralidade, essa sutileza é ainda mais
perigosa, pois os machismos estão escondidos na lógica do
algoritmo e da maneira como é feita a classificação das bases
de dados que o alimentam.
Às vezes, a semelhança com a linguagem publicitária machista de tempos que gostaríamos de decretar longe e remotos, infelizmente, é ainda mais óbvia. Por exemplo, uma pessoa relatou para gente que ficou indignada com o tom da propaganda de bolsa abaixo.
Fonte: Chase&Sanborn Ad
É triste mesmo constatar que nos dias de hoje anúncios ainda
remetem a piadas machistas que fazem graça com formas de
violência e dominação sobre a mulher. "Essa propaganda parte do
pressuposto de que o marido precisa autorizar a compra, que a
mulher não tem autonomia de seus gastos e faz piada com campanhas
de denúncia de violência contra mulher. É um anúncio extremamente
ofensivo", diz ela. "Faço parte de vários grupos de apoio a
mulheres em relacionamentos abusivos, isso poderia até mesmo
indicar que estou vivenciando uma situação de abuso. Nesse
caso, ver esse tipo de publicidade me desencadearia um mal
estar ainda maior do que eu senti", complementa. O caso nos
remeteu a esse anúncio de café lá de 1952.
Mal estares não faltam. Rachael, que chegamos a entrevistar,
postou: “Prezado @facebook: a única vez que engravidei, perdi a
criança. Obrigada pelo fluxo de anúncios para as mães e mulheres
que odeiam seus corpos." Como nutricionista que trabalha com
pessoas que têm algum distúrbio alimentar, ela está bastante
sintonizada em quão prejudiciais podem ser essas mensagens. "Me
preocupo principalmente em como esses tipos de anúncios podem
afetar pessoas com transtornos alimentares ou propensas a tal,"
diz.
Fonte: Envisioning the American Dream
Qualquer semelhança, não é mera coincidência, apenas mudaram
os padrões "ganhe peso","perca peso".
Além de reclamações sobre propagandas que se utilizam de
insegurança, baixa estima ou incitam vergonha da diversidade de
corpos e formas, também encontramos relatos de mulheres que são
alvo de propaganda direcionada de remédios de depressão e
ansiedade. "O Facebook me mostra vários anúncios sobre tristeza",
tweetou Charlene. Quando entrevistada, ela disse
que a plataforma sempre mostra anúncios de mulheres chorando.
Outras mulheres também relataram receber imagens de mulheres
tristes ou chorando.
Source: Nervine advertisement
Podemos concluir que o que mudou foram as ferramentas para a
disseminação desses discursos. Se antigamente esses anúncios
sexistas genéricos se espalhavam em revistas e jornais, hoje são
distribuídos por algoritmos que nem quem paga pelos anúncios
entende direito como funciona.
Vendo todos os anúncios juntos fica mais fácil saber quem o Facebook pensa que você é e como seu perfil é vendido.
Se o que você viu te incomodou ou simplesmente você não quer alimentar essa lógica, o fuzzify.me também te ajuda a limpar todas as categorias de interesses que são visíveis para anunciantes. Ainda que o próprio Facebook também permita que você delete essas categorias, seria necessário limpar uma a uma e com uma certa frequência, já que a plataforma constantemente te atribui novas preferências de anúncios de acordo com sua navegação e interações na rede.
O fuzzify.me deleta todas as categorias rapidamente e de uma só vez. E, caso você queira, também é possível ativar lembretes para ativar a função de limpeza de vez em quando. Assim, ao contrário dos ad blockers (bloqueadores de anúncios), que não deixam você visualizar os anúncios que estão de alvejando, o fuzzify.me não deixa que anunciantes tenham acesso às categorias de anúncios que o Facebook te atribui.
Com o tempo, você poderá observar se os tipos de propaganda que você está visualizando mudaram de acordo com as categorias e informações que você deletou ou se simplesmente essa ferramenta de controle que o Facebook disponibiliza na verdade não te dá controle nenhum. Descobriu mais coisas estranhas usando o fuzzify? Conta pra gente!
Texto por Joana Varon e Becca Ricks
Experimentos com Propagandas por Joana Varon e Carol Monteiro
Ilustrações das Propagandas por Clara Juliano
Pesquisa Sobre Propagandas por Joana Varon e Becca Ricks
Desenvolvimento da Extensão por Hang Do Thi Duc
Concepção da Extensão por Hang Do Thi Duc, Becca Ricks e Joana Varon
Vídeo do Fuzzify por Joana Varon e Clara Juliano
VoiceOver do Vídeo por Carol Monteiro
Traduções por Trajano Pontes
Agradecimento especial a Brett Gaylor, Kevin Zawacki e Who Targets Me